Era domingo, fui despertada pelo
barulho da chuva já que era dia de dar descanso ao velho amigo despertador.
Me espreguicei toda, passando a
mão no canto da cama como quem procura algo ou alguém. Me dei conta que minha única companhia para aquele dia era a chuva. Levantei, busquei a camiseta enorme
que estava jogada no chão, penteei os cabelos com a mão e fui preparar meu dia.
Tombei sobre alguns sapatos jogados pela casa, garrafas vazias... Lembranças da
noite anterior e de algumas outras. Passei pelo espelho da cozinha, gostava de me olhar dentro das camisas que não eram minhas, sentia ser duas pessoas em uma,
sorri e balancei a cabeça como se estivesse sendo uma pessoa idiota (e
estava).
Café coado, pão assado com
manteiga e um pote de requeijão: degustei minha primeira refeição já pensando no
que preparar para o almoço, talvez um strogonoff de frango, arroz branco e
batata palha, deixaria a sopa para a noite (tempo frio é sinônimo de sopa).
Voltei pra cama, liguei a tv,
notícias sobre o que o tempo estava causando... Adormeci ali.
Sem que esperasse qualquer
ser humano a mais naquele ambiente do que eu, chegou com um beijo quente, embora seu corpo estivesse molhado - tinha tomado a maior chuva. Não quis fazer
barulho, tirou os sapatos e, só de meias, saiu contando passos para o chuveiro,
permaneci imóvel, fingindo não ter acordado só para ganhar mais mimos, beijos
e cuidados, para quando o banho alheio terminasse. Tinha anoitecido, as horas
passaram rápido naquela breve soneca da tarde... Pensei conmigo: era uma vez
uma sopa.
Percebi que o banho tivera
terminado quando senti os pingos, que vinham do cabelo, caindo sobre minha testa, durante aquele beijo fofo de esquimó. Sabia que meu dengo preferido era aquele
e sem contar que era a melhor forma de me acordar sem despertar meu mau humor. "Coisa fofa, rs".
Tirou a toalha que já estava pra
lá de molhada e cobriu com o lençol envolto a mim, me abraçou, cheirou meu
cabelo, perguntou sobre meu dia e se desculpou por sair às pressas naquela
manhã, tinha perdido a hora, desativou seu despertador no celular para não me
acordar e confiou no sentido. Não deu certo, mas deu tempo de resolver seus
afazeres.
Me convenceu a levantar com mais
uns mimos, abrimos o vinho que tinha trazido para aquela noite chuvosa,
preparou uns petiscos com queijos e salgados. Não me deixou cozinhar, só pediu
que fizesse companhia na cozinha. Conversamos entre uns beijos e outros.
Observava seus olhos negros, que sumiam quando sorria, e destacava mais as
sobrancelhas grossas e bem desenhadas, que só aquele rosto possuía. Me
perguntava em qual parte eu acertei o pulo para que pudesse ter tudo
"aquilo" pra mim.
Ganhou meu coração com gentilezas
e meu estômago pelo feito em cozinhar bem. Combinava nossas noites sempre
procurando saber o que gostaria de fazer em dupla, até as surpresas eram
pré-combinadas, só eu que não percebia.
Terminou os trabalhos na cozinha,
me conduziu à mesa, brindamos ao amor que estávamos plantando. Falou sobre os
desejos em me ter em seus dias bagunçados. Disse que precisava de alguém que
lhe fizesse perder mais vezes as horas, só para ter motivos de despertar feito
uma pessoa louca depois de dormir entre meus braços, sorri sem freio, sabia
como me encantar! Por falar em frear, precisava parar de puxar tantas vezes o
freio de mão do meu coração, estava sentindo tudo que fazia meu coração capotar
e isso era um aviso. Me pediu pra falar antes do brinde, só pude agradecer,
aliás era só o que consegui dizer naquele momento em que me perdia em meus
pensamentos: "Obrigada, muito obrigada!"
Eu estava de fato feliz. Olhava
pela janela a chuva que caía, e me via sendo banhada de amor naquele momento,
quis experimentar a dança na chuva e o beijo entre pingos, fomos para a área de
fora e como pessoas doidas nos pusemos a sorrir, pular diante da chuva que nos
acolhia... Como as coisas simples se tornam mais lindas quando estamos felizes,
senti a felicidade me invadir, banhar a alma e o coração.
Meu momento era de pura gratidão
por ser uma pessoa feliz, realizações que vinham aos poucos me impulsionando a
seguir em frente. O coração finalmente pulsava naturalmente e a "culpa era
sua".
De fato, os bons momentos da vida
chegam sem avisar, não vem com seu nome endereçado em uma caixa pelos correios
como a maioria das encomendas, mas, sim, chegam destinadas à você quando tem que
ser e quando devem acontecer.
Desde aquele domingo, bastava chover para sabermos como iria ser ou quem iria surpreender primeiro. Os melhores momentos tem sido regados a chuva e domingos, que é para
nos manter sempre dentro um do outro. Eu - vestida com sua camisa, te
acompanhando na cozinha com vinhos e dançando com ela (a chuva), para festejar e
agradecer.
Sem dúvidas aquela noite era A NOSSA! Trocamos
nossas roupas molhadas e dividimos mais um lençol, escolhemos um filme e ganhei
seu cafuné, adormeci antes mesmo de saber se era mais um filme "versão
brasileira Herbert Richers", porque teu coração que tanto batia me pôs a
dormir, era a sonoplastia dos meus dias e, essa, eu fiz bem por merecer. Você se
tornava minha melodia e só os passarinhos que cantarolaram no nascer do novo
dia sabiam o que eu sentia.